Trecho do capítulo 10 (Consertando e curando), do livro "O poder de uma pergunta aberta", lançamento da Lúcida Letra:
Desenvolvendo uma nova relação com a beleza
Tenho mais uma história sobre árvores. Em uma primavera, anos depois de ter dirigido por aquela estrada sinuosa com árvores que se coloriam no outono, Rinpoche me levou a Kyoto, no Japão, para ver as cerejeiras em flor. As flores pareciam ser o reflexo de um pôr do sol cor-de-rosa batendo na neve. Eu poderia seguir falando de sua beleza... mas algo me interessou ainda mais do que as flores: observar o povo japonês apreciando-as.
Quando os japoneses olham para uma flor de cerejeira, se em algum momento chegam a dizer alguma coisa, eles dizem algo como: “Sakura [que significa “cerejeira em flor”]... ahhh...”. “Ahhh...” pode não ser a melhor interpretação fonética do som que eles fazem, mas soa semelhante e tem sentido equivalente a “ahhh”, o som do deslumbramento em inglês. “Ahhh...” não é um som de objetificação. Isto seria mais como “hummm” (um sinal de dúvida) ou “é” (eu já sei) ou “meu deus!” (acho que entendi). O som do deslumbramento não é cerebral. Particularmente quando os japoneses o emitem, ele soa mais como um suspiro – carrega um pouco de tristeza. É o reconhecimento da beleza efêmera: beleza e decadência andam juntas, e os japoneses parecem entender isso. A vida é agridoce. Mas cá estou eu começando a tirar conclusões sobre pessoas e árvores de novo. Poderia o “ahhh” ser apenas uma expressão de absoluta abertura? – eu me pergunto.
“Ahhh” surge quando relaxamos os músculos em nossa boca suavemente aberta e deixamos o ar sair de maneira natural. Sem esforço. Por que você não tenta? Pode evocar uma sensação de profundo relaxamento. Não sou a primeira a notar – trata- se de conhecimento antigo. O som ah é a sílaba semente em sânscrito para espaço ou ausência de fronteira. Eles dizem em sânscrito que ah é inerente a todas as consoantes do alfabeto sânscrito, como as letras ra, sa ou ka. Em outras palavras, as consoantes podem apenas surgir e se mover no espaço de ah.
O que os apreciadores de cerejeiras em flor japoneses experimentam quando dizem: “Sakura, ahhh...”? Eu não sei. Mas desconfio que tem algo a ver com apreciar a beleza sem objetificá-la – criando espaço na mente para uma experiência plena das coisas.
1 comentário
Carolina
Namastê!! Meu cadastro no site para comprar o livro não conclui… não sei o que houve. Todos os dados estão corretos, mas não termina e não consigo ver o frete… aproveito para perguntar se não haverá versão eBook, pois tenho um Kobo e preferiria ler nele. Gratidão! Abraços!