Trecho do livro "Budismo com atitude".
Este aforismo nos diz que devemos transformar nossas mentes, mas, externamente, não precisamos mudar radicalmente nosso comportamento para mostrar o quanto nos tornamos “espiritualizados”. Nós nos esforçamos para atenuar as aflições mentais, melhorar a qualidade da atenção e cultivar a equanimidade, a bondade amorosa e a compaixão. Quando conseguimos um pouco de progresso, a inclinação natural é se mostrar: “eu costumava ser mesquinho mas, agora, olha só como sou generoso. Eu costumava ser impaciente mas, agora, olha como sou tranquilo!” Queremos mostrar o que conquistamos, externalizar as boas transformações que ocorreram dentro de nós. O compromisso é o de resistir à tentação de externalizar o progresso espiritual. Mantenha essas práticas profundas, produza grandes mudanças em sua mente, mas deixe sua conduta permanecer como está.
Este aforismo destaca uma grande diferença cultural entre o Tibete e o Ocidente. Nos catorze anos em que vivi com monges, iogues e lamas tibetanos, nunca ouvi nenhum tibetano dizer: “Tenho que lhe contar insights que tive na minha meditação da manhã”. Isso é muito diferente do Ocidente, onde tantos de nós estamos ansiosos para compartilhar, ou mesmo transmitir, nossas experiências e insights espirituais. Meditamos um pouco e precisamos contar a alguém como fomos bem. Um antigo aforismo tibetano diz: “se você agitar um pote com um pouco de água, faz bastante barulho. Mas se sacudir um pote cheio de água, mantém-se o silêncio.” Aqueles com profundo insight espiritual não sentem necessidade de chamar a atenção para si mesmos a respeito disso. Evite fazer propaganda de suas revelações internas, e não mude o comportamento externo para exibir novas virtudes. Claro que os antigos comportamentos negativos são abandonados, mas sua transformação interna permanece silenciosamente dentro de você mesmo.
A lógica por trás desse conselho é muito prática. Quando exibimos nossas realizações, essa é uma demanda por respeito que diz: “Eu sou especial”. A exibição externa de novas virtudes é uma indicação de que a prática do Darma está sendo colocada a serviço das oito preocupações mundanas – “Me respeite. Me elogie. Eu sou um ser especial”. Nesse caso, estragamos tudo. Deixando a transformação ocorrer dentro, sem essas exibições externas, torna-se menos provável que a prática espiritual seja cooptada como apenas mais um meio para obter respeito, admiração, riqueza e assim por diante.
Certa vez ouvi o Dalai Lama responder a um ocidental sobre qual era seu grau de realização, algo que um tibetano jamais sonharia perguntar, e ele respondeu: “Isso é problema meu”. Isso não quer dizer que os lamas tibetanos nunca falem sobre suas experiências internas, mas costumam fazer isso com base em uma “necessidade de saber”, com a motivação de inspirar os outros em sua própria prática, não para despertar a admiração dos outros.